Arquivo do mês: julho 2010

Os já não tão jovens deuses

O ano de 1989 foi talvez o melhor ano da música pop pós década de 60. Se não dá pra competir com 1967 e os lançamentos de “Velvet Underground and Nico“, “Pet Sounds”, “Sgt.Pepper“, “Beggar’s Banquet“, “The Doors“, e “Piper at the Gates of Dawn“, discos como “Life’s Too Good“, “Freedom“, “Songs for Drella” e muitos outros fazem com que o já distante ano faça parte da história da música pop.

Um desses álbuns fundamentais é L’Eau Rouge, segundo disco da banda suíça The Young Gods. O combo suíço apresentou a ouvidos brasileiros o verdadeiro significado de “rock industrial”, numa época em que industrial muitas vezes era confundido com EBM (electronic body music – dos também históricos belgas do Front 242) ou New Beat (do também belga Tragic Error).

Samples, colagens, mixagens de guitarras barulhentas, música clássica, polca em uma música ao mesmo tempo lírica e furiosa. Mas o que na época fez dos suíços únicos foi o fato de cantarem em francês.

Long Route

Rue des Tempetes

L’Eau Rouge

La Fille de la Mort

L’Amourir

Posteriormente eles começaram a cantar em inglês, visando a entrada no mercado norte-americano. Com isso parte do charme e da originalidade da banda se perdeu, o que não impediu que eles ainda gravassem músicas poderosas.

Gasoline Man

Kissing the Sun

Salomon Song (Kurt Weil)

Seu último lançamento é o álbum acústico (????) Knock on the Wood, onde os suíços fazem versões com violões e outros instrumentos para suas canções anteriormente forjadas em computadores, sintetizadores e samplers.

The Young Gods in Venice (Knock on the Wood)

I’m the Drug (acústica)

Long Route (acústica)

Não estão mais tão jovens. Mas o The Young Gods ainda está anos-luz à frente da música atual, como estavam em 1989.

Um poema às quartas

Teresa

A primeira vez que vi Teresa
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também qua a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.

A piedade como protesto

Depois do romantismo paródico de Puchkin, o autor que definiu a cara da literatura russa na primeira metade do século XIX foi Nikolai Gogol. O que eu conhecia sobre Gogol se resumia em uma versão da peça “O Inspetor Geral“, encenada a mais de dez (talvez quinze) anos dirigida por Antonio Abujanra e a peça “The Overcoat“, baseada no conto O Capote, pelo grupo britânico Gecko.

Ambas peças tratam do mundo do funcionalismo público russo na época do império. Corrupção, tráfico de influência, abuso de autoridade, tudo o que faz de ambas as montagens algo estranhamente contemporâneo e familiar, a despeito das diferenças temporais e geográficas que separam o Brasil do século XXI da Rússia do século XIX.

Mas na leitura de “O Capote” e de outra de suas novelas, “Diário de um Louco” essa semelhança atinge sua aproximação máxima.

Diferentemente da caracterização estilizada, romântica e exagerada dos personagens em Puchkin, os personagens de Gogol não fazem parte do universo da nobreza, da corte e do exército (os extratos elevados da sociedade – normalmente sujeitos à representação literária). São os funcionários mais baixos dentro do departamento de estado. Os escrivões. Que vagam pelas ruas sem ter dinheiro para coche, que não tem dinheiro para aquecimento na gélida São Petersburgo, que não tem perspectiva.

Mas diferentemente do que se imaginaria, não há a representação realista-naturalista. E isso faz do maravilhoso, sobrenatural (realismo fantástico, quase) presente nos contos de Gógol cada vez menos estranho à realidade.

Além do elemento sobrenatural, o que permite que o público leitor de então (uma parcela ínfima de qualquer sociedade – ainda mais na Rússia) aceite ler relatos sobre a classe baixa é o sentimento de piedade que o leitor passa a ter pelos protagonistas. Akaki Akakiévich é parvo ao extremo. Sua incapacidade de se expressar, seu sonho de aceitação graças ao seu novo capote, a humilhação que recebe de seus colegas, das autoridades policiais, tudo recebido de maneira estóica, com sofreguidão e resignação, cativam a simpatia do leitor para a pobre criatura.

Poprishchin, em “Diário de um Louco”, por outro lado, cativa pelo cômico. A progressiva escalada em direção à loucura, percorrida por este outro funcionário público, também fascinado pela insersão social, nos proporciona um dos mais interessantes relatos sobre a esquizofrenia na literatura. O fim de ambos, previsivelmente, é trágico, ainda que cômico ou sentimental.

E a tragicidade, o sentimentalismo e o sobrenatural são as armas que permitem que tais relatos contundentes sobre a situação social na Rússia penetrem, subrepticiamente, nos palacetes e salas de leitura da nobreza e burguesia russas. O deleite com a própria miséria é também algo que nos é bastante caro. Como Machado de Assis e suas crônicas da cidade do Rio de Janeiro, ao mesmo tempo escravagista e iluminista, nos mostra.

O casamento entre homossexuais

Texto tirado do Blog do Alon, com negritos meus.

O casamento entre homossexuais (20/07)

Em resumo, trata-se apenas de lançar o tema da escolha sexual no rol dos assuntos com que o Estado nada tem a ver

Falta nesta eleição alguém viável e que reúna coragem para dizer simplesmente o seguinte: “Vou fazer como a presidente da Argentina, vou trabalhar para aprovar no Congresso Nacional a liberação plena do casamento entre pessoas do mesmo sexo”.

É casamento mesmo, e não subformas de contornar a encrenca. O debate entre os argentinos foi esclarecedor. Trata-se apenas de garantir um direito fundamental: o da igualdade. Se heterossexuais podem casar-se, por que não estender a prerrogativa aos homossexuais?

Assuntos como a religião e a orientação sexual são da esfera privada. E o Estado? Cabe a ele oferecer as condições para o pleno exercício do direito de escolha. Só. Se determinada igreja condena certas preferências sexuais, que selecione os fiéis como bem entender. Mas é assunto dela, não nosso (se a ela não pertencemos).

Complicado é a Igreja Católica tratar com suavidade os casos de pedofilia homossexual em suas fileiras e, ao mesmo tempo, pressionar os poderes constituídos para manter como cidadãos de segunda categoria os homossexuais que desejam levar uma vida transparente, digna e cidadã.

Idem para as demais igrejas, incluídas as evangélicas. Se estão insatisfeitas com a influência do catolicismo na esfera pública, não é razoável que também queiram ditar normas para quem não segue sua cartilha.

É hora de enfrentar o preconceito, nas diversas variações. Uma delas: a resistência a permitir que casais homossexuais adotem crianças.

Vamos acabar com isso. Dezenas de milhares de pequenos órfãos ou relegados esperam uma oportunidade de futuro. Orientação sexual não define a qualidade do pai, ou da mãe, para criar o filho, ou a filha.

Em resumo, trata-se apenas de lançar o tema da escolha sexual no rol dos assuntos com que o Estado nada tem a ver.

Eis um ponto. Mas infelizmente é baixa a probabilidade de ele e outros relevantes serem debatidos com franqueza e objetividade. O script dos candidatos viáveis é sabido. Eles percorrem o país não para saber o que devem fazer, mas principalmente para recolher os vetos provenientes dos diversos grupos de pressão.

Assim, pouco a pouco, os candidatos vão se transformando em portadores do nada. Ou do quase nada. A consequência natural é serem incapazes de mobilizar a sociedade. Daí que estejamos diante da campanha eleitoral talvez mais passiva desde a redemocratização.

Do jeito que vai, ela só galvanizará mesmo os portadores e beneficiários de espaços estatais (ou paraestatais) e os candidatos a um. Cada qual no seu papel. Já a sociedade acompanhará à distância, reservando-se o direito de decidir na hora da urna.

Nos países desenvolvidos costuma ser assim, quando a eleição não coincide com nenhuma grande crise. O problema é que nós não somos ainda um país desenvolvido. Temos impasses gigantescos a superar. Impasses cuja solução exige imensa energia social.

O “casamento gay” é um exemplo. Deve haver outros. Mas em fase de bonança econômica nem o governismo quer marola nem a oposição tem coragem de ousar.

Uma pena.

Um poema às quartas

Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico:
– Diga trinta e três.
– Trinta e três… trinta e três… trinta e três…
– Respire.

– O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
– Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
– Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

Thank God it’s Friday – Biertruppe Vintage nº 1

A última cerveja que eu mostrei aqui, a Tcheca, é uma cria da Biertruppe, cuja história já foi contada, portanto não irei repetí-la.

Mas repetirei a dose do fabricante. Hoje falo da Biertruppe Vintage nº 1. O conceito de cerveja “vintage” é aquela cerveja que passa por um processo de envelhecimento, que lhe acrescenta características e aprofunda a complexidade de sabores e aromas na cerveja. Muitas vezes são cervejas safradas (como vinhos) e em alguns casos as garrafas são numeradas. Uma excelente vintage (uma Old Ale, pois vintage não é estilo) é a Strong Suffolk.

A Biertruppe Vintage nº 1 tem uma história longa. A cerveja, depois de brassada foi armazenada em barris de carvalho por 100 dias (diferente da fraude Bohemia Oaken, que conta com “chips” de carvalho, pedacinhos de madeira colocadas no líquido para passar algumas características amadeiradas para o produto final) e depois foi engarrafada. Teoricamente, estaria pronta para a venda no final de 2009. Mas a burocracia (ou burrocracia) impediu a aprovação do rótulo da cerveja nos órgãos federais. Eles encrencaram com o termo “vintage” (o que atrasou também o lançamento da Colorado Vintage, que foi rebatizada para poder receber a liberação), pois segundo os “especialistas”, não seria um termo aplicável à cerveja (certamente eles não conhecem cerveja e nem a Strong Suffolk Vintage Ale, a Fuller’s Vintage Ale e dezenas de outras cervejas “vintage”).

Pois bem. No final das contas, não houve liberação. A cerveja passou a ser degustada apenas por poucos afortunados. Sorte minha que fui um deles.

Lembro que a alguns meses o Edu Passarelli disse no Twitter que a Biertruppe Vintage é a melhor cerveja já produzida no Brasil. Pois é. Parece coisa de quem quer puxar a brasa para a sua sardinha. Mas não.

A cerveja é realmente única. Especial. É uma Barley Wine de 9% de teor alcoólico que por ter passado 100 dias em barril de carvalho assumiu características muitíssimo particulares. A cerveja foi feita com cepas de fermento e lúpulo ingleses e tem um paladar bastante refinado. Pouca carbonatação e uma espuma média, bege. O aroma é intenso e muito complexo. Eu percebi a madeira, frutas (frutas secas), adocicado (baunilha?) e um pouco de álcool. Como os barris que receberam a nº 1 antes haviam acondicionado vinho e brandy, algumas características dessas bebidas passaram pra cerveja. O sabor acompanha a cerveja, com frutado, sabor de álcool (calor) moderado e muito integrado no conjunto. O corpo é denso. O líquido parece ser mais “grosso” que as cervejas normais. Não é para ser bebido aos golões. Mas para ser sorvida, degustada com atenção, respeito e reverência.

Pois, afinal de contas, realmente se trata da melhor cerveja já produzida no Brasil. Pena que, a exemplo das outras criações da Biertruppe, uma vez que acabar, não será produzida de novo. Deixará saudades.

Um poema às quartas

Human Family

I note the obvious differences
in the human family.
Some of us are serious,
some thrive on comedy.

Some declare their lives are lived
as true profundity,
and others claim they really live
the real reality.

The variety of our skin tones
can confuse, bemuse, delight,
brown and pink and beige and purple,
tan and blue and white.

I’ve sailed upon the seven seas
and stopped in every land.
I’ve seen the wonders of the world,
not yet one common man.

I know ten thousand women
called Jane and Mary Jane,
but I’ve not seen any two
who really were the same.

Mirror twins are different
although their features jibe,
and lovers think quite different thoughts
while lying side by side.

We love and lose in China,
we weep on England’s moors,
and laugh and moan in Guinea,
and thrive on Spanish shores.

We seek success in Finland,
are born and die in Maine.
In minor ways we differ,
in major we’re the same.

I note the obvious differences
between each sort and type,
but we are more alike, my friends
than we are unalike.

We are more alike, my friends,
than we are unalike.

We are more alike, my friends,
than we are unalike.

Família Humana

Eu noto óbvias diferenças
na humana família.
Alguns somos sérios,
outros atraídos pela alegria.

Alguns declaram que suas vidas são vividas,
como verdadeira profundidade,
e outros clamam que realmente viveram
a verdadeira realidade.

A variedade de nossos tons de pele
deixa confundido, admirado, aturdido,
marrom e rosa e bege e púrpura
moreno e azul e lívido

Naveguei pelos sete mares
e parei em todo lugar,
vi as maravilhas do mundo
e ainda nem um homem vulgar.

Conheço dez mil mulheres
que Maria e Mariana são chamadas,
mas não vi quaisquer duas
que fossem realmente igualadas

Espelhos duplos são diferentes
apesar de seus traços motejados,
e amantes pensamentos bem diferentes pensam
enquanto deitados lado a lado.

Amamos e perdemos na China,
sobre as amarras da Inglaterra choramos,
e rimos e lamentamos em Guiné,
e na costa de Espanha prosperamos.

Buscamos sucesso na Finlândia
em Maine nascemos e morremos.
em coisas menores diferimos,
nas maiores nos parecemos.

Eu noto óbvias diferenças
entre cada forma e tipo,
mas somos mais iguais, meus amigos,
que desiguais.

Somos mais iguais, meus amigos,
que desiguais.

Somos mais iguais, meus amigos,
que desiguais.

(Traduzido por por Sam)

O talento venceu a mourinização

No início da copa eu havia conjecturado que a influência de Mourinho e sua hiper-retranca, vitoriosa na última Liga dos Campeões com a Internazionale, haveria de fazer escola. Ou ao menos que seria a influência maior nesta Copa do Mundo. Não estava sozinho. O comentarista da ESPN e editor do site Trivela, Leonardo Bertozzi, havia (de forma muito mais suscinta, como convém a um comentário de 140 caracteres) dito o mesmo.

Pois a previsão caiu por terra, ainda que parcialmente.

É verdade que na fase de grupos um grande número de equipes usaram a forte retranca, a defesa compactada em duas linhas de quatro, às vezes cinco, com um ou dois homens para puxar o contra-golpe e isso deu resultado muitas vezes. A Suíça, em sua surpreendente vitória contra a Espanha, é prova disso. Mas não só. Outras equipes se basearam na força de sua defesa contra ataques mais poderosos e se deram bem.

Mas não foi um novo paradigma tático o que desmontou as retrancas. Foi o talento. E a necessidade. Em um torneio de pontos, as retrancas podem fazer com que equipes fracas roubem pontos das fortes. E num torneio de partidas eliminatórias essas equipes fracas podem até conseguir empurrar a decisão das partidas para as prorrogações e disputas penais. Mas isso certamente não é o suficiente para garantir um título.

Nas quartas-de-finais houve uma grande celebração ao futebol ofensivo, com equipes que se baseavam na força defensiva tendo caído nas fases anteriores, como Coréia do Sul, Japão, Eslováquia e outras. E mesmo equipes que se caracterizaram pela pegada de marcação, como o Uruguai, Gana e Paraguai, mostraram possuir talento para se lançarem ao ataque.

Gana, que se defendeu muito bem contra Sérvia, Alemanha e Austrália, sem ter demonstrado competência ofensiva, partiu pra cima dos EUA, um time também muito técnico e que soube anular a Inglaterra anteriormente, e venceu merecidamente. Merecia ter vencido o Uruguai por ter imposto maior volume de jogo, mas não dá pra não se emocionar com a partida épica que os celestes fizeram. Mesmo o Paraguai, o mais defensivo dos times nas quartas, conseguiu incomodar a Espanha.

Mas as semi-finais representaram a vitória do talento. Espanha, Holanda, Uruguai e Alemanha. Cada time conta com vários atacantes de talento, técnica e habilidade. Enquanto a Espanha tem o artilheiro da Copa e os melhores meias do mundo (Villa, Iniesta, Xavi), a Alemanha surpreendeu com seus jovens velocíssimos e mortais (Müller, Özil) e seus veteranos decisivos (Klose, Podolski). Uruguai jogou com a habilidade de Forlán, com a força de Cavani, com a volúpia de Abreu, e não pode contar com o artilheiro Suarez. E a Holanda tem em Kuyt, Van Persie, Robben e seu maestro Sneijder a esperança (e realidade) de gols.

A final reúne uma pragmática mas ainda muito habilidosa Holanda contra o time da posse de bola, passes, dribles e inventividade que é a Espanha. A um ano eu disse que o que a Espanha representa hoje, o Brasil representou em 1982. O futebol que encanta o mundo. Não encantou na Copa, mas até pegar a Alemanha, não havia enfrentado uma única equipe que tivesse a ousadia de atacá-los. Todos os adversários anteriores se fecharam na defesa e se contentaram em perder de pouco. A Alemanha pagou o preço da ousadia.

Quem ganhar será merecido. Como seria merecida a chegada da Alemanha à final (que time que enfia quatro na Inglaterra, na Argentina, ganha de Gana e massacra a Austrália não mereceria a final?). Mas, não importando quem leve a taça, quem ganhou mesmo é o futebol.

Pata Pata

A Copa da África do Sul está sendo uma bela celebração. Embora ainda haja terríveis desigualdades e desmandos, é emocionante ver um povo que foi tão horrendamente oprimido manifestar sua alegria, seu contentamento e sua cultura como os sul-africanos tem feito.

E não há como falar em cultura sul-africana sem lembrar da Mama Africa, Miriam Makeba, que além de grande cantora foi importante ativista anti-apartheid. Exilada, impedida de entrar em sua terra natal e por fim tendo sua cidadania revogada, Makeba representou na música o que Mandela e Desmond Tutu representaram no ativismo político.

Sua canção símbolo, Pata Pata, foi cantada pela linda cantora Lira na festa de abertura da Copa.

Portanto, discordo do (esteticamente belo) comercial da ESPN narrado pelo Bono, que diz que isso (a copa) não tem nada a ver com política, com direitos. Tem sim tudo a ver. Tem a ver sim. Tem a ver com o resgate da cidadania de um povo inteiro.

Um poema às quartas

The Dance

(held up for me by
an older man. He told me how. Showed
me. Not steps, but the fix
of muscle. A position
for myself: to move.

Duncan
told of dance. His poems
full of what we called
so long for you to be. A
dance. And all his words
ran out of it. That there
was some bright elegance
the sad meat of the body
made. Some gesture, that
if we became, for one blank moment
would turn us
into creatures of rhythm.

I want to be sung. I want
all my bones and meat hummed
against the thick floating
winter sky. I want myself
as dance. As what I am
given love, or time, or space
to feel myself.

The time of thought. The space
of actual movement. (Where they
have taken up the sea, and
keep me against my will.) I said, also,
love, being older or younger
than your world. I am given
to lying, love, call you out
now, given to feeling things
I alone create.

And let me once, create
myself. And let you, whoever
sits now breathing on my words
create a self of your own. One
that will love me.

A Dança

(explicado
por um homem mais velho. Me disse como. Me
mostrou. Não eram passos, mas
a instância do músculo. Uma posição
para mim mesmo: mover-se.

Duncan
dizia de dança. Seus poemas
cheios do que há tanto queríamos
que fosses. Uma
dança. E todas as suas palavras
saíam dali. Que havia
alguma elegância brilhante
que a carne triste do corpo
fazia. Algum gesto, que
se nos tornássemos, por um instante intenso
nos transformaria
em criaturas de ritmo.

Quero ser cantado. Quero
minha carne e todos os meus ossos murmurados
contra o flutuante céu
espesso do inverno. Me quero
dança. Como sou se
tenho amor ou tempo ou espaço
para me sentir.

O tempo do pensamento. O espaço
do movimento real. (Para onde eles
alçaram o mar e me têm
contra minha vontade.) Eu disse, também,
ama, sendo mais velho ou mais jovem

que teu mundo. Estou inclinado
a me deitar, amar, te convidar
agora, inclinado a sentir as coisas
que só eu crio.
E que eu possa uma vez criar-me
a mim mesmo. E que tu, seja quem for
sentado agora respirando minhas palavras,’
possas criar um ser somente teu. Que
vai me amar.

(Tradução: Italo Marconi Jr.)

A subversão do cristianismo

As mudanças radicais no mundo ocidental tem levado muita gente a reexaminar o modo como a igreja existia dentro da cristandade. Muitos tem prestado crescente atenção às vozes que vem das margens, tanto dentro quanto fora do mundo ocidental. Essas vozes (juntamente com Rahner, Hauerwas e Willimon) apontam que a igreja da cristandade havia se tornado uma igreja profundamente comprometida. Aqui três dessas vozes serão brevemente analisadas.

A primeira nasceu na América Latina e encontra sua expressão nas obras dos teólogos da libertação. A teologia da libertação sustenta que a igreja da cristandade ocidental (bem como o modelo de “Nova Cristandade” de Jacques Maritain na América Latina) é uma igreja maculada pelo sangue dos oprimidos. Ao associar-se aos detentores do poder, a própria igreja tornou-se um dos opressores, recusando-se de modo ativo ou passivo a engajar-se em determinadas atividades ou diálogos. O fato de que muitos cristãos ocidentais se mostrem incapazes de ver o elo entre libertação e fé revela o quanto domesticaram o evangelho que começou como “boas novas” para os pobres. Uma das consequências disso é que muitos revolucionários sociais e guerreiros da liberdade acabaram abandonando a igreja, pois “não encontraram na instituição qualquer possibilidade de concretizarem o seu comprometimento, vendo-se muitas vezes obrigados a assumir uma postura de oposição à igreja como sociedade”.

A segunda voz ergue-se da comunidade Sojourners/Residentes temporários, e encontra expressão na obra de Jim Wallis. Em sua crítica do cristianismo cultural, Wallis argumenta que a igreja da cristandade é essencialmente falha devido a suas alianças com a mídia e com as estruturas de poder político. Isso produz um nacionalismo evangélico que simplesmente perpetua a teologia do império. Por ter aceitado as grandes questões do império, todas as vezes que toma alguma posição a igreja o faz de modo equivocado. Isso gera uma igreja impotente que “salva” as pessoas ao mesmo tempo em que deixa de transformar a sociedade.

Essa, afirma Wallis, é uma completa traição do cristianismo. Na cristandade ocidental:

…essa inversão é tão completa, a cegueira tão total, que hoje em dia interesses ricos e poderosos chegam a usar a evangelização a fim de enfocar a atenção das pessoas nos seus pecados pessoais, de modo a distraí-los da realidade da exploração e da opressão.

Em vista disso Jacques Ellul, a terceira voz profética, argumenta que o cristianismo tem sido totalmente subvertido pelo estado e pelos poderes. A igreja triunfante do cristianismo, que batizou a sociedade e fez de todos os seus membros cristãos, representa o rigoroso oposto do cerne da fé cristã. Pois o cristianismo, como revelado no Novo Testamento, não pode fazer milhões de convertidos nem tem como gerar entradas de milhões de dólares. Como o cristianismo existe em conflito com a sociedade e o estado, a igreja tende a cansar-se dessa tensão. Então “toma lugar a subversão, não porque a sociedade é perversa, mas porque a revelação é intolerável”. Porém, como as pessoas dentro da cristandade não querem dar a impressão de que rejeitam o cristianismo, ele é pervertido e subvertido. Dentro desse cristianismo subvertido as forças do estado, do dinheiro, do poder, do engano, da acusação, da divisão e da destruição passam a reinar. Esses poderes só se mostram incapazes de se tornarem soberanos por causa do trabalho do Espírito Santo. O sucesso dos poderes dentro do cristianismo, sua “vitória explosiva”, só pode ser compreendido como a bem-sucedida subversão do cristianismo.

À luz do declínio da cristandade é especialmente importante ouvir essas vozes, para que não aconteça que a igreja limite-se a buscar um simples retorno à era da cristandade. Ao invés de retornar à cristandade, a igreja missional deve voltar a uma compreensão mais genuína da sua fé, uma que dê ouvidos às vozes proféticas e desconfie das alianças com poderes sócio-políticos. Como afirma Rahner, “deveríamos ficar surpresos de quão raramente a igreja entra em conflito com os detentores do poder. Isso por si só deveria fazer com que nos tornássemos profundamente desconfiados de nós mesmos”.

Daniel Oudshoorn
Poser or Prophet

Copiado de A Bacia das Almas

Thank God it’s Friday – Tcheca

O estilo de cerveja número um do Brasil é a pilsen. Todas as principais e mais vendidas cervejas no Brasil são pilsens, da Antarctica à Brahma, Skol, Schin, todas. Bem… pelo menos no rótulo. Isso porque o que o estilo pilsen (seja o bohemian pilsen, da república tcheca, mais amargo ou o german pilsen, alemão, um pouco mais suave) pede é uma cerveja refrescante, de coloração amarela intensa e com aroma herbal de lúpulo e alto amargor.

Definitivamente, nesse mundo de cervejas aguadas, sem amargor, sem nenhum corpo, com levíssimo, quase desaparecido traço de malte e sem aroma nenhum, o que tomamos nos nossos bares e restaurantes passa longe de ser uma pilsen. Basta comparar a Heineken, uma pilsen industrial de larga escala (cerveja de trabalho), mas que no Brasil virou “premium” com outras cervejas.

Nesse mundo de lagers medíocres, sem sabor, sem amargor, sem aroma, algumas cervejarias mais preocupadas com a qualidade de seus produtos lançaram boas opções no mercado. A Bamberg tem sua excelente pilsen. Bem como a Eisenbahn, a Colorado (uma levíssima cerveja, com baixo amargor, mas com muito mais qualidade que o ‘xixi de cavalo’ engarrafado que se vende por aí), a Baden Baden e outras.

Mas a grande pilsen do Brasil não é fruto de uma indústria, mas esforço de uma turma de amigos dedicados à cerveja, a Biertruppe.  Formada por Edu Passarelli, dono do Melograno e um dos primeiros no Brasil a escrever sobre cervejas especiais, Leonardo Botto, cervejeiro caseiro do RJ e responsável por algumas das melhores receitas produzidas no Brasil, André Clemente, artista gráfico e criador dos rótulos, e Alexandre Bazzo, dono da cervejaria Bamberg, uma das mais premiadas cervejarias do Brasil. Esses quatro teimosos produziram a Tcheca pela primeira vez em 2008. Depois veio a blond ale belga Saint Nicholas, para homenagear o natal. A última cria da turma é a barley wine Vintage nº1, ainda não disponível no mercado. E em comemoração à Copa do Mundo, a turma relançou sua primeira cria: a Tcheca.

Antes de ser engarrafada ela estava disponível em versão chopp no Melograno. Nesta versão ela era servida sem a filtragem, portanto sua cor era mais turva, com amargor mais pronunciado. Agora ela estará disponível para venda em garrafa em versão filtrada, mais clara, menos amarga e mais herbal.

É disparada a melhor pilsen produzida no Brasil. É refrescante como convém a nosso clima tropical. Mas é amarga. Mais amarga que as suas concorrentes premium (Bamberg, Colorado, Eisenbahn, Baden Baden) e com um aroma muito agradável de lúpulo herbal.

O teor alcoólico está dentro do padrão do estilo (5º) que permite que ela seja bebida em quantidade razoável sem pesar no estômago e nem deixar a pessoa meio aérea, de forma que ela não perceba as qualidades da cerveja.

Se não dá para celebrar a Copa com essa grande cerveja, visto nossa precoce eliminação frente à seleção da Heineken, digo, da Holanda, dá para passarmos alguns meses saboreando uma das melhores crias da cervejaria nacional. Mas tem de correr, pois é uma edição limitada e quando acabar, acabou.