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Plebiscito Pelo Limite Da Terra

PLEBISCITO PELO LIMITE DA TERRA

Vivem hoje na zona rural brasileira cerca de 30 milhões de pessoas, pouco mais de 16% da população do país. O Brasil apresenta um dos maiores índices de concentração fundiária do mundo: quase 50% das propriedades rurais têm menos de 10 ha

por Frei Betto

Entre 1 e 7 de setembro o Fórum Nacional da Reforma Agrária e Justiça no Campo promoverá, em todo o Brasil, o plebiscito pelo limite da propriedade rural. Mais de 50 entidades que integram o Fórum farão da Semana da Pátria e do Grito dos Excluídos, celebrado todo 7 de setembro, um momento de clamor pela reforma fundiária em nosso país.

Vivem hoje na zona rural brasileira cerca de 30 milhões de pessoas, pouco mais de 16% da população do país. O Brasil apresenta um dos maiores índices de concentração fundiária do mundo: quase 50% das propriedades rurais têm menos de 10 ha (hectares) e ocupam apenas 2,36% da área do país. E menos de 1% das propriedades rurais (46.911) têm área acima de 1 mil ha cada e ocupam 44% do território (IBGE 2006).

As propriedades com mais de 2.500 ha são apenas 15.012 e ocupam 98,5 milhões de ha: 28 milhões de hectares a mais do que quase 4,5 milhões de propriedades rurais com menos de 100 ha.

Diante deste quadro de grave desigualdade, não se pode admitir que imensas propriedades rurais possam pertencer a um único dono, impedindo o acesso democrático à terra, que é um bem natural, coletivo, porém limitado.

O objetivo do plebiscito é demonstrar ao Congresso Nacional que o povo brasileiro deseja que se inclua na Constituição um novo inciso limitando a propriedade da terra – princípio adotado por vários países capitalistas – a 35 módulos fiscais. Áreas acima disso seriam incorporadas ao patrimônio público e destinadas à reforma agrária.

O módulo fiscal serve de parâmetro para classificar o tamanho de uma propriedade rural, segundo a lei 8.629 de 25/02/93. Um módulo fiscal pode variar de 5 a 110 ha, dependendo do município e das condições de solo, relevo, acesso etc.. É considerada pequena propriedade o imóvel com o máximo de quatro módulos fiscais; média, 15; e grande, acima de 15 módulos fiscais.

Um limite de 35 módulos fiscais equivale a uma área entre 175 ha (caso de imóveis próximos a capitais) e 3.500 ha (como na região amazônica). Apenas 50 mil entre as cinco milhões de propriedades rurais existentes no Brasil se enquadram neste limite. Ou seja, 4,950 milhões de propriedades têm menos de 35 módulos fiscais.

O tema foi enfatizado pela Campanha da Fraternidade 2010, promovida pela CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). Todos os dados indicam que a concentração fundiária expulsa famílias do campo, multiplica o número de favelas e a violência nos centros urbanos. Mais de 11 milhões de famílias vivem, hoje, em favelas, cortiços ou áreas de risco.

Nos últimos 25 anos, 1.546 trabalhadores rurais foram assassinados no Brasil; 422 presos; 2.709 famílias expulsas de suas terras; 13.815 famílias despejadas; e 92.290 famílias envolvidas em conflitos por terra! Foram registradas ainda 2.438 ocorrências de trabalho escravo, com 163 mil trabalhadores escravizados.

Desde 1993, o Grupo Móvel do Ministério do Trabalho libertou 33.789 escravos. De 1.163 ocorrências de assassinatos, apenas 85 foram a julgamento, com a condenação de 20 mandantes e 71 executores. Dos mandantes, somente um se encontra preso, Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, um dos mandantes da eliminação da irmã Dorothy Stang, em 2005.

Tanto o plebiscito quanto o abaixo-assinado visam a aprovar a proposta de emenda constitucional (PEC 438) que determina o confisco de propriedades onde se pratica trabalho escravo, bem como limites à propriedade rural. As propriedades confiscadas seriam destinadas à reforma agrária.

Embora o lobby do latifúndio apregoe as “maravilhas” do agronegócio, quase todo voltado à exportação e não ao mercado interno, a maior parte dos alimentos da mesa do brasileiro provém da agricultura familiar. Ela é responsável por toda a produção de verduras; 87% da mandioca; 70% do feijão; 59% dos suínos; 58% do leite; 50% das aves; 46% do milho; 38% do café; 21% do trigo.

A pequena propriedade rural emprega 74,4% das pessoas que trabalham no campo. O agronegócio, apenas 25,6%. Enquanto a pequena propriedade ocupa 15 pessoas por cada 100 ha, o agronegócio, que dispõe de tecnologia avançada, somente 1,7 pessoas.

Frei Betto é escritor, autor de “Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura militar brasileira” (Rocco), entre outros livros. http://www.freibetto.org -Twitter:@freibetto

*Este artigo foi publicado na edição de 13 de agosto de 2010 do Correio Braziliense, na editoria Opinião, pág. 17

http://www.limitedaterra.org.br/index.php

A Paróquia da Trindade (Igreja Anglicana) oferecerá seu espaço, entre os dias 1-7 de setembro, para o Plebiscito pelo Limite da Propriedade da Terra. Participe assinando o abaixo assinado.

Endereço

Praça Olavo Bilac, nº 63. Campos Elíseos. CEP 01201-050. São Paulo-SP Tel/Fax: 11- 36678161
Próximo a Estação Metrô Marechal / início da Av.Angélica
Estacionamentos: Praça Olavo Bilac e na Rua Pirineus.

http://trindade.org/drupal/

O casamento entre homossexuais

Texto tirado do Blog do Alon, com negritos meus.

O casamento entre homossexuais (20/07)

Em resumo, trata-se apenas de lançar o tema da escolha sexual no rol dos assuntos com que o Estado nada tem a ver

Falta nesta eleição alguém viável e que reúna coragem para dizer simplesmente o seguinte: “Vou fazer como a presidente da Argentina, vou trabalhar para aprovar no Congresso Nacional a liberação plena do casamento entre pessoas do mesmo sexo”.

É casamento mesmo, e não subformas de contornar a encrenca. O debate entre os argentinos foi esclarecedor. Trata-se apenas de garantir um direito fundamental: o da igualdade. Se heterossexuais podem casar-se, por que não estender a prerrogativa aos homossexuais?

Assuntos como a religião e a orientação sexual são da esfera privada. E o Estado? Cabe a ele oferecer as condições para o pleno exercício do direito de escolha. Só. Se determinada igreja condena certas preferências sexuais, que selecione os fiéis como bem entender. Mas é assunto dela, não nosso (se a ela não pertencemos).

Complicado é a Igreja Católica tratar com suavidade os casos de pedofilia homossexual em suas fileiras e, ao mesmo tempo, pressionar os poderes constituídos para manter como cidadãos de segunda categoria os homossexuais que desejam levar uma vida transparente, digna e cidadã.

Idem para as demais igrejas, incluídas as evangélicas. Se estão insatisfeitas com a influência do catolicismo na esfera pública, não é razoável que também queiram ditar normas para quem não segue sua cartilha.

É hora de enfrentar o preconceito, nas diversas variações. Uma delas: a resistência a permitir que casais homossexuais adotem crianças.

Vamos acabar com isso. Dezenas de milhares de pequenos órfãos ou relegados esperam uma oportunidade de futuro. Orientação sexual não define a qualidade do pai, ou da mãe, para criar o filho, ou a filha.

Em resumo, trata-se apenas de lançar o tema da escolha sexual no rol dos assuntos com que o Estado nada tem a ver.

Eis um ponto. Mas infelizmente é baixa a probabilidade de ele e outros relevantes serem debatidos com franqueza e objetividade. O script dos candidatos viáveis é sabido. Eles percorrem o país não para saber o que devem fazer, mas principalmente para recolher os vetos provenientes dos diversos grupos de pressão.

Assim, pouco a pouco, os candidatos vão se transformando em portadores do nada. Ou do quase nada. A consequência natural é serem incapazes de mobilizar a sociedade. Daí que estejamos diante da campanha eleitoral talvez mais passiva desde a redemocratização.

Do jeito que vai, ela só galvanizará mesmo os portadores e beneficiários de espaços estatais (ou paraestatais) e os candidatos a um. Cada qual no seu papel. Já a sociedade acompanhará à distância, reservando-se o direito de decidir na hora da urna.

Nos países desenvolvidos costuma ser assim, quando a eleição não coincide com nenhuma grande crise. O problema é que nós não somos ainda um país desenvolvido. Temos impasses gigantescos a superar. Impasses cuja solução exige imensa energia social.

O “casamento gay” é um exemplo. Deve haver outros. Mas em fase de bonança econômica nem o governismo quer marola nem a oposição tem coragem de ousar.

Uma pena.

Pata Pata

A Copa da África do Sul está sendo uma bela celebração. Embora ainda haja terríveis desigualdades e desmandos, é emocionante ver um povo que foi tão horrendamente oprimido manifestar sua alegria, seu contentamento e sua cultura como os sul-africanos tem feito.

E não há como falar em cultura sul-africana sem lembrar da Mama Africa, Miriam Makeba, que além de grande cantora foi importante ativista anti-apartheid. Exilada, impedida de entrar em sua terra natal e por fim tendo sua cidadania revogada, Makeba representou na música o que Mandela e Desmond Tutu representaram no ativismo político.

Sua canção símbolo, Pata Pata, foi cantada pela linda cantora Lira na festa de abertura da Copa.

Portanto, discordo do (esteticamente belo) comercial da ESPN narrado pelo Bono, que diz que isso (a copa) não tem nada a ver com política, com direitos. Tem sim tudo a ver. Tem a ver sim. Tem a ver com o resgate da cidadania de um povo inteiro.

Desmendigação

Nesta terça-feira, ao esperar por um serviço de impressões, estava lendo a Folha de São Paulo quando topei com a seguinte reportagem:

“terça-feira, 1 de junho de 2010

Campanha para expulsar pedintes da Santa Cecília pressiona restaurantes

Estratégia do conselho de segurança do bairro é ameaçar quem doa alimento com visita da Vigilância Sanitária

AFONSO BENITES
DE SÃO PAULO

Moradores e comerciantes de Santa Cecília (centro de São Paulo) traçaram uma estratégia para expulsar os moradores de rua do bairro: farão uma ofensiva para que ONGs e restaurantes parem de doar comida a pedintes.
Segundo o último censo de sem-teto da cidade, divulgado ontem, há 1.334 moradores de rua e frequentadores de albergues nesse distrito.
Quem vive na região diz que esse número aumenta a cada dia devido à repressão ao tráfico na área da cracolândia, na mesma região.
A restrição de doações aos sem-teto foi planejada em reunião do Conseg (Conselho Comunitário de Segurança) na última semana, que foi acompanhada pela Folha. Entre os participantes da reunião, estavam representantes de moradores, comerciantes, polícia, Subprefeitura da Sé, Guarda Civil e hospital Santa Casa. Ninguém se manifestou contra a proposta. Uma comerciante disse que jogava desinfetante nos moradores de rua que dormiam na porta de sua loja pela manhã. Houve quem afirmasse que passaria a fazer o mesmo.

“Deveria haver um local que concentrasse todas as instituições que querem doar. Mas não na rua, sem higiene”, diz o presidente do Conseg, Jorge Rodrigues. Para o representante da Santa Casa, Edison Ferreira da Silva, outro problema das doações é que os sem-teto acabam jogando restos de comida e de roupas na rua, o que colabora para entupir os bueiros do bairro.

ABORDAGEM
O conselho iniciará sua estratégia mapeando ONGs, lanchonetes e restaurantes que doam comida. O segundo passo será procurar os responsáveis de cada lugar para convencê-los a suspender a doação.
O conselho avisará, por fim, que, ao constatar que algum local continua alimentando os moradores de rua, a Vigilância Sanitária será chamada para que interdite estabelecimentos irregulares.

Procurada, a Vigilância adianta que não há problema nenhum em doar comida, desde que a refeição seja servida com higiene. O órgão costuma orientar restaurantes sobre como fazer a doação.

Um sem-teto de 19 anos ouvido pela reportagem diz que o plano do Conseg não funcionará. “Se não nos derem comida, vamos começar a roubar”, ameaça.

A pós-doutora em saúde pública e em educação pela USP Aparecida Magali Alvarez, que desde 1993 pesquisa moradores de rua, critica o plano de expulsão. “A sociedade deveria se unir para ajudá-los”, afirma.
Já o frentista Marcos Magella, que há dez anos trabalha na região, vê a presença dos sem-teto como problema, mas discorda da escolha do Conseg. “O problema mesmo é a droga. Se impedirem o tráfico, os mendigos vão embora”, declarou.”

Não. Eles (Conseg) não irão pressionar quem dá comida aos pombos, pois os pombos transmitem doenças graves. Tampouco irão pressionar os donos de terrenos baldios a capinarem suas áreas, pois elas ajudam na proliferação dos ratos, que transmitem peste e um sem-número de outras doenças. Também não irão pressionar a Polícia Militar para melhor policiar a área, ou a prefeitura para melhor equipar o serviço social e o sistema de albergues.

Não. Irão pressionar restaurantes e comerciantes por alimentarem sem-teto. Isso mesmo. ESTÃO AMEAÇANDO QUEM DOA COMIDA A SERES HUMANOS EM SITUAÇÃO DE NECESSIDADE.

A mentalidade classe média, a mesma que critica qualquer forma de caridade ao alegar que “isso é responsabilidade do governo” mas também condena o Bolsa Família, que tira 15 milhões de famílias do perigo de morte por inanição, pois isso é “paternalismo e bolsa-esmola”. O certo, dizem tais filósofos, não é dar o peixe. É ensinar a pescar. O certo é dar emprego. Como se a capacitação de um contingente maciço de indigentes, de pessoas que sequer tem acesso à educação formal, fosse possível, após séculos e séculos de abandono, coronelismo e indigência.

A hipocrisia nojenta dessa parcela da sociedade é a que apóia as açõe higienistas da gestão Kassab, que reveste o piso sob viadutos de maneira a impedir que se durma sob eles, que instala encostos de braço nos bancos para que os sem-teto não durmam neles, ao invés de criar mecanismos sociais práticos e eficazes para a retirada dos moradores de rua e sua reinserção na sociedade.

As lendas sobre certos governantes que enchiam aviões de mendigos para depois jogá-los ao mar (às vezes atribuídas a Lacerda, às vezes a ACM) poderia ser realidade, na mentalidade desses cidadãos de bem…

P.S. Aqui está a reportagem sobre a pavimentação anti-mendigos implementada pela prefeitura PSDBista/DEMista:

“Serra põe rampa antimendigo na Paulista
A gestão do prefeito José Serra (PSDB-SP) começou nesta semana a instalar rampas de concreto “antimorador de rua” em uma das extremidades da avenida Paulista, na passagem subterrânea que leva à Doutor Arnaldo. O piso será chapiscado, tornando-o mais áspero e incômodo para quem tentar dormir no local.”

Aqui as obras do Kassab: República está mais clara e terá câmeras de segurança. Outra novidade da revitalização é o banco ‘antimendigo’. Diferentemente do construído na Praça da Sé, o assento traz divisórias que limitam o espaço suficiente para acomodar uma pessoa não-obesa. Na Sé, o banco tem formato curvado nas pontas e é menor.

P.P.S. Uma defesa da política social implementada pelo governo Lula.

P.P.P.S. Aqui o porque uma ação séria, responsável e humana é possível:


Abolição?

Se nos Estados Unidos o fim da escravidão levou décadas para se consolidar, imagina no Brasil, onde os movimentos por ações afirmativas são torpedeados pela mídia mainstream de direita ligada à FIESP, FEBRABAM e congêneres?

Então, para lembrar a não-abolição da escravidão de 13 de maio, a mera transferência em massa das senzalas para as favelas, uma importante reflexão sobre o tema:

Mais que uma assinatura.

Foi quando “Cristóvão Colombo”, em 1492, invadiu as Américas que a escravidão passou a ser um grande negócio. Os negros eram trazidos, em sua maioria, da costa ocidental da África, entregues em trocas de quinquilharias, (como facas, espadas, armas de fogo, munições, chapéus, peças de vidro e barras de ferro) pelos próprios governantes da África.

Os primeiros negros chegaram ao Brasil por volta do ano de 1580 para trabalhar nas lavouras (cana-de-açúcar, mais comumente). Os negros eram trazidos nos desprezíveis navios negreiros, as viagens duravam meses e muitos negros não sobreviviam a elas devido às condições subumanas a que eram submetidos, falta de higiene, superlotação e alimentação precária contidas na viagem.

Não se pode pensar que os negros aceitaram pacificamente a opressão e nem que toda a população brasileira da época concordava com a situação imposta pela escravidão. Até que veio uma assinatura e pôs fim na história. Fazer isso é limitar a história da abolição, é ignorar e desrespeitar a memória dos mártires negros, heróis e heroínas, negros e brancos, anônimos que perderam suas vidas lutando pela liberdade. Bem, na historia da abolição houve muito mais sangue do que tinta.

Enfim a assinatura faz parte de um todo formado pelo movimento abolicionista e seus membros, mártires (entre eles José Carlos do Patrocínio e Zumbi dos Palmares) e a pressão internacional (em especial da Inglaterra). A queda da escravidão é muito mais que uma assinatura. Na verdade a assinatura, na minha modesta opinião, é a menor parte.

Continua no blog Projeto5

E também, que tal lembrarmos do mais importante militante pelos direitos civis da história: Martin Luther King.

Martin Luther King, Discurso proferido nos degraus do Lincoln Memorial, em Washington, a 28 de Agosto de 1963

“Estou contente por juntar-me a vós hoje, o dia que entrará para a história como o da maior manifestação pela liberdade na história da nossa nação.

Há cem anos, um grande americano, sob cuja sombra simbólica nos encontramos, assinava a Proclamação da Emancipação. Esse decreto fundamental foi como um raio de luz de esperança para milhões de escravos negros que tinham sido marcados a ferro nas chamas de uma vergonhosa injustiça. Veio como uma aurora feliz para terminar a longa noite do cativeiro. Mas, cem anos mais tarde, devemos enfrentar a realidade trágica de que o Negro ainda não é livre.

Cem anos mais tarde, a vida do Negro é ainda lamentavelmente dilacerada pelas algemas da segregação e pelas correntes da discriminação. Cem anos mais tarde, o Negro continua a viver numa ilha isolada de pobreza, no meio de um vasto oceano de prosperidade material. Cem anos mais tarde, o Negro ainda definha nas margens da sociedade americana, estando exilado na sua própria terra.

Continua no site Esquerda.net

Por fim, o sermão pregado pelo rev.Luiz Carlos Ramos sobre o tema:

Cartas, algemas e promissórias – Reflexões sobre a liberdade e a libertação a partir da carta de Paulo a Filemom


Luiz Carlos Ramos

No dia 13 de maio de 1888, diz-se que foi abolida a escravatura, pelo menos a oficial, legalizada pelo Estado e abençoada pela Igreja. Essa data é analisada da seguinte maneira pelo historiador Alfredo Bosi:

“o treze de maio não é uma data apenas entre outras, número neutro, notação cronológica. É o momento crucial de um processo que avança em duas direções. Para fora: [porque] o homem negro é expulso de um Brasil moderno, cosmético, europeizado. Para den­tro: [porque] o mesmo homem negro [é] tangido para os porões do capita­lismo nacional, sórdido, brutesco. O senhor liberta-se do escravo [grifo meu] e traz ao seu domínio o assalariado, migrante ou não. (…) Não se decretava oficialmente o exílio do ex-cativo, mas passaria a vivê-lo como estigma na cor da sua pele. Entre as conseqüên­cias dos séculos de escra­vidão no Brasil desenvolveu-se um quadro de exclusão dos negros. No Brasil um branco recebe mensalmente, em média, o dobro do negro.”

Justamente pelo fato de que essa libertação foi antes a do senhor do que a do escravo, é que os negros brasileiros se recusam a comemorar esta data. Como sabemos, e anualmente concelebramos, a data festejada pelos negros é a do Dia da Consciência Negra, aos 20 de novembro, relembrando o martírio de Zumbi dos Palmares, assassinado no ano de 1695. Mas esta é uma outra história.

Continua no blog Texto e Textura.

Drops humorísticos

Fim de semestre na UNIBAN

 

Copiado de Arnaldo Branco.

linchamento

E este do Alan Sieber.

P.S. Eu estou meio atrasado nesta semana, mas sexta feira tem coisa nova e de punho próprio no blog.

A Puta da Uniban (sic)

O blog “Boteco Sujo” dá uma amostra do que aconteceu semana passada em um campus universitário (??????) paulista:

“Uma estudante de Turismo cometeu o crime de ir para faculdade vestindo apenas uma blusinha que mal chegava até suas coxas. Quando a garota começou a subir uma das rampas da universidade, oferecendo uma vista privilegiada das suas redundâncias, provocou um levante entre marmanjos que provavelmente nunca haviam visto uma mulher sem roupa desde que foram desmamados. Os estudantes começaram a cercar a moça, com gritos e galanteios de pedreiro, e foram se empolgando até que ameaçaram estuprá-la. Ela, então, correu e se trancou numa sala.

Foi aí que todos os alunos abandonaram as aulas e se aglomeraram numa multidão que ameaçava invadir a sala onde a garota havia se escondido, aos gritos de “puta, puta!”. Homens e mulheres se juntaram para xingá-la. Foi preciso que um grupo de policiais militares entrasse no prédio para evitar que a menina se tornasse a protagonista de um gang bang forçado.

Agora, uma retificação. Nada disso aconteceu nos tempos moralistas e patriarcais da boa rainha Vitória. Essa história aconteceu, de verdade, na noite da última quinta-feira, dia 22, no câmpus da Uniban em São Bernardo do Campo.” Continua aqui.

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A Marjorie Rodrigues escreve um longo post sobre a humilhação pública como arma de intimidação ditatorial e traça um paralelo ao caso recém acontecido.

” E é aí que entra o negócio da Uniban. É no mínimo interessante chegar de viagem e dar de cara com uma notícia dessas. As pessoas ainda não vêem horror numa humilhação pública. Ainda acham que há coisas que alguém possa fazer para merecer isso. Ainda acham que há o que a justifique. Não vêem um ato de extrema violência nisso. É fácil olhar para um monte de corpos empilhados e dizer “ai, que horror”, mas a gente não vê (ou se recusa a ver) que a força geradora dessas atrocidades está aí, na capacidade de dar aquele sorriso. Na capacidade de se juntar a uma turba e gritar “puta, puta, puta”.

A Mary W escreveu sobre isso. Muito bem, como sempre. Que a gente só vê a violência no outro e não percebe que a violência está em nós. Que a gente faz parte disso. Uma coisa que eu percebi em muitos comentários Internet afora (inclusive teve um mais ou menos assim aqui) é que a reação instintiva é dizer que os alunos da Uniban agiram como “animais”. Eu também já falei sobre animalização aqui. Mas nunca custa repetir. Que, quando você animaliza o outro, está distanciando ele de você. Porque animais não têm solução, não podem aprender a ser humanos nunca. Reduzir o outro assim é, também, uma violência. E, para cometer violência contra alguém, só mesmo não o considerando um semelhante.

Ora, os alunos da Uniban não são loucos, não. Não são animais, não. São seres humanos. Só levaram ao extremo uma forma de pensar que é muito disseminada: que a mulher é a culpada por seu estupro, que as roupas denotam recato ou promiscuidade e que promiscuidade é meio de avaliar o caráter de uma mulher. Os alunos da Uniban só levaram ao extremo o machismo que a gente vê disseminado de forma mais sutil em tantos outros lugares. Repare também que tem gente condenando os alunos da Uniban, dizendo: ”mesmo que ela fosse uma puta e desse pra todo mundo, não justifica”– ou seja: apesar de condenar a humilhação pública, ainda condenam a roupa. Ainda submetem as mulheres à dicotomia santa x puta. Ou seja: pensam igualzinho a quem criticam. São tão machistas quanto.”

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Pois bem. Toda uma psicologia das massas possa ser evocada para explicar esse episódio. Mas não apenas. Se as massas assumem prontamente o mais irracional que possa existir no cérebro do ser humano (aliás, como as brigas de torcidas, confrontos de skin-heads, e linchamentos podem comprovar), a cultura atual já naturalizou o machismo, como o Fausto, do blog Boteco Sujo, percebeu ao conversar com um dos rapazes da Uniban: “Uma fala do aluno com quem conversei resume o clima daquele ambiente universitário: — Eles estavam errados em querer estuprar a mina, mas ela provocou, né, véio? Então…  Então? — Então talvez ela merecesse.”

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Outro tópico interessante, sobre outro assunto mas que dialoga de maneira contundente com este acontecimento, foi escrito há um mês, mais ou menos, pelo Rafael Galvão:

“A postura francesa no pós-guerra é uma das coisas mais impressionantes daquela época. Se o país não foi corajoso o bastante para resistir à Alemanha, coragem não lhe faltou para perseguir as mulheres que “colaboraram” com a Alemanha — ou seja, que tentaram sobreviver dormindo com o inimigo, como mais tarde milhares de alemãs ganhariam o chucrute de cada dia de pracinhas americanos. Deve ser algo na psique francesa: os alemães podiam estuprar o país, mas não podiam seduzir suas mulheres.”

Uma pequena diferença entre Londres e Paris.

Update: A Uniban está se mobilizando. Não para punir os responsáveis. Mas para tirar os vídeos que mostram a agressão do ar. Os dois videos que ilustram essa postagem já foram apagados pelo Youtube. Mais informações aqui.

P.S. No iG há uma matéria onde a atitude boçal e cretina dos universitários é mostrada.