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Canções de Setembro

Bertold Brecht é um dos nomes fundamentais do teatro do século XX. Criador do chamado “teatro épico”. Segundo Brecht, o drama burguês, com sua técnica realista, procura a identificação emocional e o enlevo. Seu objetivo era outro. Ao invés de mostrar, narrar. Ao invés de identificar, estranhar. Através do estranhamento e do distanciamento, o espectador conseguiria analisar e aprender, ao invés de se enlevar e se emocionar. A busca era sempre a da análise crítica.

Uma das principais ferramentas de estranhamento utilizadas por Brecht era a música. Seus principais colaboradores musicais foram Hans Eisler e Kurt Weil.

Só que a obra de Weil foi tão excelente que alçou vôo próprio. O próprio Brecht temia que as canções de suas peças mais belas como “The Rise and Fall of the City of Mahagonny” e “The Three Penny Opera” encantariam tanto o público que eles seriam levador por elas, ao invés de as utilizarem como elemento de estranhamento.

Bem, havia o risco.

Em 1997 uma série de importantes artistas como Lou Reed, Nick Cave, P.J.Harvey e outros lançaram September Songs, uma coletânea com algumas das principais canções de Weil e Brecht.

Alguns tostões:

Nick Cave – Mack the Knife

P.J. Harvey – Ballad of the Soldier’s Wife

David Johansen – Alabama Song

William Burroughs – What Keeps Mankind Alive

Lou Reed – September Song

Lotte Lenya – Jenny the Pirate

Um exemplo de peça teatral e musical em estilo brechtiano foi “A Ópera do Malandro”, com “O Malandro” sendo uma versão de “Mack the Knife” e “Genni e o Zepelin” uma adaptação de “The Pirate Jenny”.

Contextos parecidos.

O Capote

Após longo e tenebroso inverno, voltei a uma das atividades que mais gosto e, proporcionalmente, menos faço: ir ao teatro.

Na verdade a história da minha ida a esta peça está ligada a uma disciplina opcional que escolhi na faculdade: introdução à literatura russa (???). Pois é. Numa conversa informal com um aluno aqui de onde trabalho descobri que o Teatro Popular do Sesi, aqui em SP, estava com a peça The Overcoat/O Capote, do Gecko Theatre Company, uma companhia internacional com atores do mundo todo sediada em Ipswich, Inglaterra. O projeto é um trabalho conjunto do Sesi com o British Council, que faz esse intercâmbio Brasil-Inglaterra de maneira bem interessante. A produção anterior havia sido Cymbeline, peça pouco conhecida de Shakespeare, encenada de maneira brilhante pela companhia Kneehigh Theatre em 2008. Excelente.

Mas, o que a introdução à literatura russa tem a ver com isso? Bem, uma das obras a serem estudadas neste semestre é justamente “O Capote“, de Nicolai Gogol. Conto que narra a história de Akaki, escriturário pobre atormentado pelos colegas pelo fato de ter um capote (peça importantíssima na gélida Rússia do século XIX) esfarrapado. Ao comprar um novo capote, vê a mudança de tratamento que recebe, que dura pouco tempo pois o tem roubado.

Temas completamente atuais como discriminação social, exploração do trabalho, ritmo maquinal e cronometrado são abordados na peça de maneira interessantíssima. Enquanto o Cymbeline da Kneehigh era falado em inglês, com legendas projetadas em português, o Capote do Gecko é falado em português (apenas o personagem principal), francês, inglês, espanhol, italiano, alemão e japonês, tudo ao mesmo tempo agora. E a narrativa é sustentada através do que o grupo chama de “teatro físico”.

Quem perdeu, perdeu.