Em 1991 “Sandman“, uma história em quadrinhos escrita por Neil Gaiman, ganhou o prêmio “World Fantasy Award” como melhor conto. Em 1992 a graphic novel “Maus“, escrita por Art Spielgelman, venceu o Pulitzer. A revista Time escolheu “Watchmen“, graphic novel em série escrita por Alan Moore (mesmo autor de “V de Vingança“) como um dos cem melhores romances do século XX. Em 2006 “American Born Chinese” foi indicado ao prêmio “National Book Award” de melhor romance. A questão se as histórias em quadrinhos são arte ou literatura levou Tony Long, editor da revista Wired, a escrever o artigo “The Era of Mediocrity” (A era da mediocridade), onde o autor dizia que embora algumas graphic novels fossem boas, jamais deveriam ser consideradas romances ou contos de verdade. As respostas foram inúmeras, criticando-o inclusive por ser um “obcecado pela forma (do romance tradicional)”. E de acordo com Mark Sigel, editor da empresa que lançou “American Born Chinese”, passara da hora de esquecer-se dos aspectos “formais” das graphic novels para concentrar-se nos aspectos “de conteúdo”, como narrativa, personagens, enredo, ponto de vista, etc.
Desta forma eu iniciei um “paper” que escrevi a vários anos para obter os créditos na disciplina de Estudos Culturais, onde eu comparei Madame Bovary, romance fundamental de Gustave Flaubert e Gemma Bovery, graphic novel inspirada no romance de Flaubert, escrito por Posy Simmonds.
Claro que meu objetivo não será fazer uma crítica literária, muito menos de literatura comparada num blog metido a pedante. Mas sim comentar e recomendar essa obra aos que se dispuserem a fugir da mediocridade em matéria de histórias em quadrinhos.
Primeiramente chama a atenção a forma da história. A Posy Simmonds mescla de maneira muito interessante a prosa com os quadrinhos, compondo uma forma “híbrida” de difícil classificação.
E se a obra original de Flaubert destilava sua acidez contra a burguesia provinciana francesa, contra o clero, contra o casamento, narrando com realismo até então inaudito tabus como o adultério, Posy Simmonds de maneira semelhante transpõe essa acidez contra os yuppies e a juventude urbana de classe média londrinos.
Ainda não tive a oportunidade de ler “Tamara Drewe“, obra subsequente da autora onde ela dialoga com outro clássico do romance do século XIX: “Far from the Madding Crowd“, de Thomas Hardy, que como Gemma Bovery foi inicialmente publicado como folhetim, encartado na edição impressa do jornal inglês “The Guardian“. Outra referência aos romances do século XIX ao reproduzir a forma como muitas obras chegaram aos públicos: em fascículos.
P.S. No mesmo dia da publicação do meu post, mas um pouquinho mais tarde (o meu entrou às 8:00 hs e este entrou às 18:11 hs) o Paulo Ramos, do Blog dos Quadrinhos publicou um post sobre outras obras que misturam prosa e quadrinhos (aqui).